segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Embaixador da Espanha discute a possibilidade de atrair mais investimentos para o Nordeste

Crises são oportunidades. De ajustes, aprendizado, adaptações. São, sobretudo, chances de crescimento e melhoria, como avalia o embaixador da Espanha no Brasil, Manuel de la Cámara Hermoso. O avanço das políticas de imigração europeias e a aquisição de empresas financeiramente enfraquecidas são, para o diplomata, exemplos de frutos colhidos a partir da crise de refugiados na Europa e da crise econônima no Brasil, respectivamente. Em passagem por Pernambuco, ele debateu esses e outros temas em reuniões com o governador Paulo Câmara e com secretários ligados às pastas de Agricultura e Cultura do estado.

Encontros voltados à gestão de recursos hídricos, formação de gestores culturais e mostras voltadas ao cinema e às artes plásticas estão na lista de eventos previstos para o próximo ano, já em fase de planejamento. No fim deste mês, Hermoso se reúne novamente com Câmara, em São Paulo, onde empresários espanhóis serão apresentados às condições de infraestrutura de Pernambuco, a fim de atrair mais investimentos ao Nordeste do Brasil – o país, com cerca de 120 mil espanhóis formalmente registrados em consulados, é o principal destino de investimentos da Espanha na América Latina e o segundo no mundo.

O senhor esteve em audiência com o governador Paulo Câmara. Quais são, no momento, os interesses da Espanha em relação a Pernambuco? 
Sim. Fui recebido em audiência pelo governador Paulo Câmara, o que foi, para mim, uma grande honra. Já estive com o governador anterior Eduardo Campos. Mas tinha muito interesse em conhecer Câmara. Falamos sobre muitas coisas, visto que as possibilidades de parceria e colaboração entre a Espanha e o estado de Pernambuco são muito amplas. Falamos, primeiro, sobre o que já está sendo feito. Naturalmente, é muito importante a presença do Instituto Cervantes aqui no Recife. É um instituto rotativo, que tem uma atividade tradicional no ensino do idioma espanhol, mas também uma intensa atividade cultural. Falamos também sobre o que está sendo feito em âmbito econômico. Temos instaladas aqui algumas empresas espanholas, como a Pamesa, na linha de materiais de construção; a Celite, dedicada a material sanitário e de banho; a Iberdrola, no âmbito de eletricidade. No futuro, gostaríamos de promover ainda mais a presença econômica da Espanha no estado de Pernambuco. Por isso, combinei com o governador Paulo Câmara um encontro com empresários representantes de instituições espanholas. Será em São Paulo, onde a maioria das empresas espanholas tem sede, e o governador já estaria em São Paulo no fim deste mês. Então aproveitamos. A ideia é que Câmara apresente o estado no âmbito de infraestrutura, de estradas, de portos, especialmente o Porto de Suape. O intuito é criar oportunidades de atrair a presença econômica da Espanha para Pernambuco.

O senhor também esteve reunido com o secretário de Agricultura. Há algum projeto previsto para essa área? 
Sim. O secretário Nilton Mota esteve comigo e falamos sobre um projeto muito interessante, que é um grande encontro técnico-empresarial sobre gestão de recursos hídricos, gestão da água. Gostaríamos de promover esse momento no Recife, provavelmente no mês de abril do próximo ano, com presença de representantes do setor privado, tanto da Espanha quanto de Pernambuco. E, se possível, ter a presença de representantes de outros estados do Nordeste do Brasil. A ideia é apresentar a experiência espanhola na gestão de recursos hídricos em situação de grande seca. Isso porque a Espanha é um país com pluviosidade muito baixa, ainda menor do que o semiárido nordestino. Apesar dessa dificuldade, nós somos capazes de, primeiramente, atender às necessidades da população e também acolher 67 milhões de turistas por ano, que nos visitam na época mais seca, o verão. Também promovemos, nas áreas mais secas do país, uma grande produção hortifrutícola, que abastece todos os grandes mercados da Europa. Mercados da Alemanha, da Holanda, da Suíça… todos muito exigentes. Desenvolvemos a tecnologia de produção hortifrutícola com aproveitamento máximo dos nossos recursos hídricos em sistema de estufa, o que poderia ser interessante para algumas áreas do interior dos estados do Nordeste.

No âmbito cultural, o Cervantes tem a tradição de promover atividades relevantes em Pernambuco. Em linhas gerais, a partir das reuniões com representantes do governo local, o que a Espanha planeja para essa área, no Recife? 
Tivemos um encontro muito interessante com Silvana Meireles, secretária executiva da Secretaria de Cultura do estado. Falamos sobre muitas possibilidades de colaboração entre o Instituto Cervantes e a secretaria, no âmbito do cinema, mas também das exposições. No próximo ano, provavelmente, a Mostra de Cinema Espanhol será realizada no Cinema São Luiz. Neste ano, faz 400 anos da publicação da segunda parte de Dom Quixote, então estamos planejando algumas apresentações em torno do tema. A Secretaria de Cultura também está interessada no intercâmbio na área de gestão cultural, da formação de gestores culturais. Pretendemos compartilhar nossa experiência na área de gestão de museus e instituições de arte públicas. No próximo ano, devemos fazer um Fórum da Sociedade Civil Espanha-Brasil, e gostaríamos que, nesse fórum, houvesse uma parte dedicada ao intercâmbio cultural entre os dois países. Afinal, a cultura é uma das principais vias de aproximação.

A crise que o Brasil está enfrentando tem afetado, de algum modo, as empresas espanholas que atuam no país? Como os espanhóis veem esse momento pelo qual o Brasil está passando? 
Como falei, as empresas espanholas estão aqui com grandes investimentos. Temos acumulados investimentos por volta de 65 bilhões de euros. São quase 270 bilhões de reais. Esse montante gera 200 mil empregos diretos e outros 200 mil indiretos. No ano passado, a Espanha foi o principal investidor estrangeiro no país, com algumas operações importantes, como a aquisição da GVT pela companhia telefônica Vivo. E neste ano, apesar da crise, as companhias espanholas consideram manter seus investimentos, pois permanecerão aqui por muito tempo. A crise abre oportunidades de compra de companhias locais, o que nos interessa. Algumas empresas espanholas detinham participação minoritária em empresas do Brasil e passaram a ter participação majoritária. Acreditamos que se trata de uma crise temporária e o Brasil é um dos principais parceiros econômicos da Espanha.

Como a Espanha está enfrentando o problema dos refugiados?
 
A questão dos refugiados é, hoje, o maior desafio da União Europeia. E é um desafio enorme, porque, naturalmente, não podemos deixar abandonadas as dezenas de milhares de pessoas que estão fugindo da violência terrível naquela parte do mundo. Mas também, naturalmente, as possibilidades de acolhimento da União são limitadas. As crises são desafios, mas também oportunidades. Com essa crise dos refugiados, avançamos muito na política europeia de imigração. Finalmente, iniciamos uma política de imigração mais coordenada e passamos a compartilhar o número de refugiados que cada país vai acolher.

Como o senhor vê a decisão da Catalunha de se separar da Espanha?
 
A questão da Catalunha é que o seu presidente, junto com outros partidos, decidiu quebrar completamente a legislação e a Constituição espanhola. É uma situação que, para qualquer país do mundo, é inaceitável. É como se o governo do Brasil, por exemplo, aceitasse que o governo de São Paulo dissesse que, a partir de agora, não vai mais respeitar a Constituição do Brasil e vai se considerar independente. A Constituição do Brasil não permitiria essa separação territorial, política. O nosso governo, naturalmente, também não pode aceitar a quebra da legitimidade e da Constituição. Vamos apresentar recursos no Tribunal Constitucional, que certamente vai atestar por unanimidade que foi ilegal o que fizeram (na Catalunha). Então, serão tomadas as medidas legais para impedir que essa situação continue. Claro que a responsabilidade do que está acontecendo é do governo da Catalunha, que deriva sua legitimidade da Constituição espanhola, e decidiu quebrá-la. Isso é absolutamente inaceitável.

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